“Choveu por
aqui um dia desses que o conhecimento é a melhor água.
Foi dito,
em Segunda-Chuva, que se não bebermos dela a sede nos conduzirá à sequidão”.
Supostamente
entendidos, cada um com o seu pote guardava o máximo que podia do que caía.
Trompando-se
alguns se quebravam, outros mais resistentes, barulhavam, mas permaneciam
intactos...
O céu nem
estava para tanta chuva, talvez por isso que alguns potes eram improvisados...
Do começo,
até o final da chuva, mesmo com potes improvisados ou inquebráveis,
E mesmo naquele trompa-trompa típico dos dias de umidade,
Os
Seguradores-de-vaso mostravam cara alegre.
Era uma
coisa que me intrigava...
Porque na chuva cada um só bebia a água de seu próprio
pote...
Não se
davam conta que a água que caía, caía do mesmo lugar...
Não se
davam conta nem porque caía em tais dias, não noutros...
Só sabiam
porque o Vento-inclinador-de-árvores os avisava e a Cor-do-céu não mais era
brilho.
O que me
intrigava não era nem tanto porque cada um bebia somente a água do seu pote,
Mas por que
mostravam cara alegre.
Olhando de
cima, parece que sentiam prazer em competir águas que caíam...
Talvez
tivessem fé naquilo, talvez nem soubessem por que faziam, talvez fizessem
porque algo que não vi mandava...
Contudo,
mostravam cara alegre, e aquilo me deixava apreensivo...
Nesse dia,
que acompanhei desde o céu em brilho, até o descanso depois do Beber-da-água
Percebi uma
coisa:
Depois de
um tempo de estiagem prolongada, que fazia secar as gargantas e empoeirar os
potes e as caras tristes
No primeiro
som de Vento-de-chuva os olhos desesperados salivaram...
Pensei
comigo, não fazem por prazer ou por capricho, fazem por extrema necessidade...
Não pude
negar que aqueles olhos transbordavam de Querer, um querer Impaciente...
Foi se
ofuscando a Cor-do-céu e o Vento-inclinador-de-árvores começou também o seu
trabalho.
Desesperadamente
os Seguradores-de-potes empunharam seu destino.
E de
cabeças baixas e cansadas sentiam os primeiros Pingos-ácidos, próprios do tempo
longo sem nenhuma gota d’água...
Beberam da Primeira-chuva
ao mesmo tempo em que a poeira dos potes se fazia fundo...
Bebiam
conhecimento, diziam, e para eles isso era inegável!
Também, na situação
sedenta que corroía!
Tudo bem,
para mim, que olhava de cima, além dos Pingos-ácidos e Pó-do-tempo, bebiam desespero...
Claro, como
poderiam os Seguradores-de-potes confortavelmente beberem a Segunda-chuva se a
sede lhes gritava e os puxava pelas mãos cansadas?!
Beberam da
Primeira e se esparramaram pelo chão como num agradecimento...
E adormeceram.
E adormeceram.
Na cena
ficaram alguns potes quebrados em uma direção, outros que serviram de encosto
noutra, outros... Na verdade outros nem pote tinham...
Ensopados e
saciados, e com a Segunda-chuva se despedindo sem ser percebida
Levantam do
êxtase e com o coro ainda molhado e com o gosto da poeira cravado na esperança respiram
cansados, e respiram cansaço...
Deu-se
início, de novo, a contagem regressiva para o desespero, o que eles chamam de
conhecimento.