Ele queria dizer que o mundo está burro, mas dizer isto num
ambiente brilhante e progressista não soaria tão bem. Queria dizer também que
filósofos, os “muito adiantados do nosso tempo”, quer dizer, excepcionais e
observadores ao último perdem lugar e a pose diante dos que, informalmente,
sabem melhor fazer e discorrer. Ele ainda continua a querer dizer que o mundo
está burro, porque, claramente, ela, a burrice, não nos deixa ver os loucos
inteligentes dizerem o que há de mais novo! "O sábio é ainda aquele o qual
ninguém consegue entender; aquele o qual todos admiram ao ouvi-lo, mesmo sem
uma única gota de desconfiança e receio: o filósofo se tornou um herói dos
cinemas, e o que importa, como todo produto, é o final do filme – seguido da
repercussão".
“O mundo está muito burro”. Da filosofia ao direito, sem
hierarquia ele diz isto, porque não existe mais a tal “hierarquia”. O povo não
sabe mais que é ser povo; o cristão não sabe mais o que é ser
cristão; o artista não sabe mais o que é artista! “O mundo,
hoje, é uma liberdade colorida e, de tão charmosa e reluzente, não diz nada
quando quer dizer muito, não faz rir quando em gargalhadas se mostra, não
surpreende quando em susto se coloca”. Assim ele disse, com todos os exageros
possíveis...
O mundo vê a notícia pelas telas, pelos pixels, pelos
nichos. O mundo, que ora fragmentado, ora unido de nada parece oferecer, a não
ser ora ignorância em fragmentos, ora ignorância em conjunto. “Que pena nos
daria se pudéssemos pensar numa bobeira dessas, não?” Se perguntou triste...
"Dizer que o mundo está burro é burrice! Mas dizer que
demos grandes passos para a discussão ou relação homem-natureza, isto sim é
inteligente! Isto sim é dizer Sim à Vida! O mundo se reúne num
Congresso Da Salvação da Natureza e, que lindo... Teremos boas notícias amanhã
nos jornais; teremos boas frases amanhã pela internet afora; teremos suplícios
realizados, porque acreditamos neles! 'Amanhã o mundo respirará melhor'.
Palmas...", negativou em gestos... Parece que ele queria dizer um
pouco mais além de afirmar que o mundo está burro; queria dizer que ele nunca
esteve tão bestial quanto hoje! Impossível? "Burrice é uma coisa,
bestialidade é outra! Não confunda nossos produtos!" Gargalhou...
O mundo talvez nunca riu tanto de piadas inconsequentes que
graça alguma têm; o mundo nunca sorriu tanto quando a desgraça ou bate à sua
porta ou deita já a sua cama; o mundo nunca aceitou tanto do “mais do mesmo”
quanto o que hoje reina. O mundo está pior... “E o mundo é o modo como os
homens se organizam nele...”. Não sabemos se ele existe (de fato...),
mas o que sai de sua possibilidade irrita qualquer ouvido... Ele parece existir
enquanto um possível...
“O mundo, então, está burro porque os homens nunca se
mostraram tão deficitários!” Os homens, talvez, nunca se mostraram tão adversos
aos comportamentos humanos, aos moldes do humano, ao conceito e ao aspecto do
animal homem! Prefere ele, hoje, virar algo que ainda não sabe o que é, mas
que, em si, já é adjetivado inteligente e novo desde o momento
crucial: este é o “homem do futuro”! E não é que ele tem razão
quando diz isso...
O homem do futuro, isto é, o hospedeiro da burrice, está
pronto para ser vendido pelas vitrines polidas e sedutoras... Aliás, ele custa
caro! Nunca a burrice valeu tanto no mundo como vale hoje. “Para se ter ideia,
paga-se milhões aos cheios de nada e nada aos engenheiros do espírito do
mundo!” O mundo está de mãos na cabeça, girando em sua poltrona nova (e preta),
gritando, sorrindo, chorando: tudo ao mesmo tempo! “As cadeiras giratórias
pretas estão em promoção, corram! É possível entrar para a história por cento e
trinta e nove reais e noventa”. Suspirou e abaixou a cabeça em tom de
quase-choro-e-quase-sorriso...
"Sabemos uns dias antes da chuva que vai chover;
sabemos alguns dias antes da doença que ela aparecerá; sabemos uns dias antes
da rua que perderemos nosso emprego; sabemos antecipadamente o nível, o nome, e
os efeitos de um desastre natural; sabemos desde sempre a cor dos olhos de
Deus, a língua que mais gosta de falar, o lugar onde mais gosta de ser tocado,
o modo como gosta de ser lembrado; sabemos muito sobre a Terra, sobre o mar,
sobre as ferramentas que neles usamos, sabemos de cabo a rabo, dóceis e
tiranos, ferozes e paisanas o movimento do mundo e o fundo..."
"Sabemos tanto que ofenderia aqueles que lidam com as
“microscopisses do mundo” se não citássemos as miudezas que nunca antes foram
tão bem percebidas e descobertas; Aliás, éramos mais inteligentes quando
conhecíamos como menor parte do mundo o pó da terra?" Denunciou...
"Nós gostamos muito de ser o “homem do futuro”, isto é o que
importa! Nós gostamos mesmo é de esquecer essas bobeiras que
escrevem por aí, como também gostamos de esquecer daqueles que pincham os
muros, as caras e a alma; nós gostamos de não saber sobre o gosto;
nós acreditamos em não querer saber; nós conhecemos o que nós é
útil, seja visível ou não".
"O mundo está burro, podem jogar as pedras. Não
ofendendo, claro, aquele nobre animal que sabe bem dosar suas forças numa
tarefa que lhe é lançada; não menosprezando aquele robusto animal, não isso!
Este, de cabeça baixa e de orelhas grandes como é falado, vai perder o título
de inferioridade daqui uns dias, pois já se pode prever isto...".
É bem provável que sejamos este novo título para designar o
deficiente, o deficitário, o incapaz, o bestial, o homem do século XXI... Aliás, Homem do Futuro parece ser bem coerente para esta nova espécie de seres
– “Sim! Nova espécie!” –, aliás, por dois grandes motivos: porque vende; porque
atende. Não pode se perguntar quem rege quem, isto é coisa do passado!
Precisamos saber que se trata de dois grandes motivos, só isso interessa...
“Homem do futuro é ótimo, mesmo que seja burro; Homem
do Futuro é lindo, mesmo que seja ridículo; Homem do Futuro é
perfeito, mesmo que seja o mais despreparado e desajustado possível.” Cortemos
nossas-vossas-tuas orelhas? Caminhemos [ainda] mais rapidamente? Ou será que deveremos deixar crescer nossas-vossas-tuas unhas e
cabelos diante dessa situação?
“Quanta pergunta errada... Nós somos o Homem do Futuro, viva!”
Suspirou pela última vez; desligou a televisão; fechou os livros e os ouvidos.
Ele ainda morrerá por não conseguir adaptar-se a essa nova espécie, pois assim
caminhamos – “e também rastejamos...” finalizou.